Monday, December 3, 2007

Leila Diniz, a oncinha!



[andré,
meu nome é joaquim ferreira dos santos, sou colunista do globo, tenho uns livros publicados com a biografia do antonio maria, outro chamado feliz 1958 e outros de crônicas.
eu estou fazendo agora uma biografia da Leila Diniz.
eu já estava te procurando, mas quem me conseguiu teu email foi o denilson, que eu conheci ontem no lançamento da biografia do tim maia (ficou espetacular).
vamos conversar sobre a leila?
de início gostaria que você me contasse tudo que se lembrasse sobre o "em busca do tesouro", que foi a estréia dela.
o denilson me disse que voce vendeu uma lambreta para fazer a produção.]...


Vamos lá! “Em Busca do Tesouro”. Lembro que a gente começou a falar na peça em torno de junho de 1964, porque foi quando fiz 20 anos e a Leila foi a primeira à chegar lá em casa pra festa. A iniciativa foi do Domingos de montar uma peça infantil. Eu tinha feito teatro com o Domingos antes, “Sétimo Céu”, em 1962. Eu fiquei logo afim. Em fins de 1963 eu tinha feito “Eles não usam Black-Tie” com o Teatro de Arena de São Paulo, e depois do golpe muitos atores estavam sendo perseguidos. Eu fui trabalhar na loja da Varig Internacional, porque era um ótimo “disfarce”. Mas eu tava seco pra fazer teatro de novo. E um infantil era perfeito. A gente fez uma sociedade, ele entrava com 2/3 da grana. Eu vendí a minha Lambretta e entrei com um terço. A peça foi escolha do Mingão, mas o autor Rubens Rocha Filho a escreveu com o nome “O Tesouro do Coronel”!! Eu achei o título pouco atraente, além de políticamente inoportuno, e mudei para “Em Busca do Tesouro”. O elenco era bem amigo. Fora a Martinha Viana que eu não conhecia ( e irônicamente nunca mais ví ou soube dela), era já bem uma turma. Yonita (que depois ficou conhecida como Ionita Guinle) era bem garota e casada com o primo da primeira esposa do Domingos, o Paulo Roberto Rocco tinha feito “As Provas de Amor” do Joào Bethencourt com um grupo amador legal do Anglo-Americano (e se não me engano tinha acabado de descolar um emprego na Editora José Olimpio), Emiliano Ribeiro (com quem uma década depois fui co-assistente de direção no filme “Em Família” do Paulo Porto) eu já conhecia desde que começou na TV Tupi, e a Leila que nunca tinha feito teatro e já vivia com o Mingão na época. Claudio MacDowell era o assistente de produção. Claudio era colega do Rocco no Anglo, e meu amigo de infância desde que estreamos juntos em teatro em 1957 em “Jogo de Crianças” do João Bethencourt e depois fizemos juntos o filme “Pega Ladrão”.

A gente ensaiou a peça na casa do Domingos, que era um dos Melhores Lugares do Mundo naqueles anos. A Leila era tímida, parecia que estava fazendo a peça mais pelo Domingos que por ela mesma. Lembro que o Domingos compôs uma canção (talvez mais de uma) para a peça e é engraçado que só retive um trechinho da música final que dizia: “... a oncinha nos ajuuuuuuuuuuuda”! E acho que éramos tremendamente desafinados.

Uma passagem interessante que lembro foi que consegui promover a peça num programa da TV Rio que era apresentado pela Riva Blanche. Fui eu, Emiliano, e a Leila. Emiliano e eu fomos “de gente”, ambos ex-“meninos-prodígios”da tv. O gancho era capitalizar que ele tinha sido o “Guguta” da série “Guguta e Tião” que fez muito sucesso na TV-Rio, Canal 13, e eu fui o primeiro “Pedrinho” do “Sítio do Picapau Amarelo” na TV Tupi, Canal 6. Já a Leila, muito encabulada, foi vestida de “Oncinha” e disse um pequeno monólogo da peça. Foi a sua primeiríssima aparição na tv! Ela estava super gracinha!

A gente estreiou a peça no Teatro do Rio, no Catete, do Rubens Correia e Ivan de Albuquerque que eram meus amigos e fizeram condições camaradas. Rubens fazia na época o “Diário de um Louco” de Gogol e a gente tapava o cenário com um telão branco. Depois da estréia o cenógrafo Pernambuco de Oliveira ficou com pena da gente e nos deu um desenho de floresta que o maquinista Humberto pintou na semana seguinte. O clima entre a gente era muito legal. E isto incluia todo o pessoal do Teatro do Rio. Tivemos prejuízo no começo, mas depois a peça pegou e todo mundo ganhava o seu dinheirinho pra semana lá. Era cooperativa, cada um com a mesma cota. O Domingos ganhava mais cotas porque tinha investido mais e era o diretor, e eu ganhava mais como investidor (saudades da lambreta!), ator e produtor executivo.

Depois de um tempo lá, passamos a montagem para o Teatro Jovem, do Kleber Santos, pois era um ponto bem melhor para teatro infantil naquela época. Nessas alturas a peça já fazia bastante sucesso, tinha uma turminha de amigos que vinha sempre, quase “groupies”. Leila se divertia muito fazendo a peça e as crianças adoravam a “oncinha”. Quando terminava, a gente ia sempre bater papinho com as crianças e a Leila era a predileta! E ela adorava curtir com as crianças. A insegurança dos ensaios e a timidez da tv tinham aparentemente desaparecidos.

A gente costumava sair um bocado juntos depois dos espetáculos, e isto é mais ou menos o que consigo lembrar. E com saudades da minha irmãzinha Leila para quem eu contava as minhas confidências de 20 anos que não se costumava contar para mulher.


Joaquim,

Mais duas coisas que gostaria de te contar sobre a Leila, a primeira uma curiosidade, a segunda bem mais.. sei lá... “esotérica” talvez.



Creio que você sabe que escreví o roteiro do filme “Os Paqueras” com meu amigão brother Reginaldo Faria. A sequencia na qual ela aparece (e eu apareço também fazendo uma aposta com o Regi) foi escrita pra gente curtir um barato paralelo. Ela foi filmada numa loja da Rua Santa Clara 41 que antes de ser loja tinha sido o apartamento térreo onde me criei desde os 3 anos de idade. Nos degraus do prédio eu me sentava para longos papos com amigos, inclusive – claro! - a Leila. Foi um barato para nós voltarmos ao mesmo lugar anos depois fazendo cinema.


Quando a Leila morreu eu fui direto pra casa da família Diniz. Era o único lugar possivel para mim estar. Mas mais que tudo eu queria dar apoio pra Liginha naqueles dias tristes e movimentados. Só saia de lá, práticamente, para gravar a novela “Tempo de Viver”na Tupi. Mas conseguia as vezes tirar a Ligia de casa para uns curtos passeios. Depois do enterro as coisas começaram à aliviar naquela casa. Uma família muito minha querida que reagiu com muito amor. Uma noite, a Lígia estava recebendo a visita de umas amigas de infância, ex-colegas de colégio (inclusive acabei me casando com uma delas, a Claudia, que conhecí naquela noite) e os papos estavam começando a ficar agradáveis e divertidos.

Foi quando a Liginha expressou a vontade de juntar a turma da “Pop” e fazer outra peça infantil. Por destas coincidências do destino, a Ligia estreiou em teatro (sem contar umas substituições em “Tem banana na banda”, numa peça infantil que dirigi em 1970, “Pop, a garota legal” de Ronaldo Ciambroni. Foi também a estréia do Claúdio Tovar como ator, cenógrafo e figurinista no Rio. Leila, que adorava a irmãzinha Ligia, me recomendou pra cuidar dela com carinho quando ainda ensaiavamos. Como se precisasse. Nesta peça atuava também a Maria Alice Langoni, Valentina Godoy, Álvaro Aguiar, entre outros. Meu parceiro nas músicas era do Eduardo Souto Neto, que regeu pela primeira vez na gravação da trilha e estourou a verba da produção que desta vez, felizmente, não era minha. A “Pop” foi um grande barato e muitas amizades daquela turma já são eternas.

Falei com o pessoal sobre o desejo da Liginha, e quem era pra topar topou direto. Como a Liginha estava numa fase de dança nesta época, como o Tovar estava numa fase de desenhar borboletas, eu bolei que a Ligia seria uma borboleta que iria dançar muito na peça. E que o nome seria “O Jardim das Borboletas”. Só que como estava fazendo a novela e trabalhando num roteiro com o Reginaldo, pedí para um amigo escrever. Ele começou um esboço mas acabou resolvendo se mudar para o norte. Pedí à um outro redator, mas ele não sacou o espírito.

Tinha um destes concursos que dão verba que a Ligia queria inscrever a peça e o tempo estava passando. Num belo dia de sol carioca, depois de uma praia ótima, eu me sentei e escreví umas 3 ou 4 páginas. E fui pra casa da Ligia. No dia seguinte eu tinha que subir para Friburgo com o Reginaldo. Era now or never. Voltamos pra minha casa e voltei para a máquina, eu ia escrevendo e a Liginha fazendo desenhinhos ao meu lado. Em certo ponto da madrugada nós demos uma parada. E ambos sentimos a presença da Leila. Foi muito bonito. Muito inspirador. E assim escreví num período de 24 horas uma peça, já com as letras das músicas e tudo, que teve um sucesso antológico desde a sua estréia na semana do Natal de 1972. A peça já teve umas 18 montagens em três décadas, pelo Brasil todo desde então e revelou muitos talentos. Acho que todas as vezes que o “Jardim” é montado a Leila sorrí. Ou será a Oncinha?

Monday, March 26, 2007

É isso aí, bicho! (ou “Eu gosto muito de montar elefantes na Tailândia”)

Mas não precisa ser elefante e nem bicho grande pra eu gostar. Dos santos, a história de São Francisco de Assis sempre foi a que mais me fascinou. E não tem como eu não pensar em todos os bichos que estão morrendo não só com o maltrato humano infligido ao ecosistema do planeta, mas também os bichos que morrem diáriamente nas guerras e tiroteios que afligem os nossos tempos.

Fiz boas amizades pela vida com Beethoven, Indy, Diesel, Jupiter, Pici, Ruby, Urso, Jubilee... e tantos bichos de amigos que ficaram meus amigos!

Eu sempre gostei de bichos. A maior diferença é que quando menino eu morava em apartamento e só podia ter cachorro de pelúcia. Mas tive gatos. Muitos. O primeiro que me lembro chamava-se “Bolinha” (e não era oval). O mais duradouro na infância foi o “Chaninho”. A gente morava num apartamento térreo na Rua Santa Clara, em Copacabana, e o Chaninho pulava muro e saía às vezes para procriar e fazer amigos. As vezes trazia algum amigo ou amiga para casa para desespero do meu pai que não gostava de gatos. Quando a procriação acontecia lá em casa ele não demorava muito para mandar um de seus funcionários reduzir a população felina do lar.

Mas não eram só gatos. Uma vez eu comprei um pintinho na feira e o pintinho era tão esperto que respondia ao assobio de uma certa música que era como um “sinal” da nossa família. Bastava assobiar e ele vinha correndo do quintal. E subia na cama e se aninhava como se fosse um gato, ou um cachorro de pelúcia. Se não me engano o nome dele era “Ximbica” em homenagem à um personagem de rádio da época. Um dia, ele já era um franguinho respeitável, um rato o assassinou no quintal. Acho que nesta época não tinhamos gatos em casa.

Depois teve a fase dos passarinhos. Tínhamos dois periquitos, um verde e um azul. O verde era do Thomas, meu irmão mais velho (acho que Jorge, o mais novo não tinha ainda nascido ou era neném de colo), e o azul era meu. Ambos dividiam a gaiola em paz maior do que meu irmão e eu dividíamos o nosso quarto. Os periquitos eram o nosso pomo da concórdia.

Mas isto não bastou, e arrumamos outra gaiola maior que povoamos com uma revoada variada que apavoraria o próprio Alfred Hitchcoock, que talvez nem tivesse filmado o seu famoso thriller “Os Pássaros”. Aquário também rolou, mas nunca demos muita sorte com peixes. Talvez porque eu tenha nascído no dia da troca de Gemeos para Cancer, talvez porque eu não coma peixes. Prefiro-os como companheiros de natação.

Só não conseguí fazer amizade foi com um papagaio que comprei, quando já moravamos num apartamento grande e comprido na Rua Tonelero, entre Siqueira Campos e Figueiredo de Magalhães. Eu já tinha o meu próprio quarto sózinho e resolví dividir com a figura. Mas o diabo do papagaio era traiçoeiro. Ele mordia. Era até engraçado vê-lo vindo pelo corredor comprido até a sala de jantar, mas ele mordia. Acabou sendo doaodo para uma funcionária da confeitaria dos meus pais. Como ela não pediu demissão e não foi trabalhar ferida, eu acho que ela e o papagaio se deram bem.Vai ver o louro preferia ser de uma mulher. Afinal, ambos falam mais.

Eu fiquei muitos anos sem animal de estimação, mas sempre fui amigo dos bichos dos amigos. E dos estranhos também. E nunca tive medo. Nem quando peguei um filhote de leão no colo num festival internacional de circo que rolou no Maracanãzinho. Uma vantagem eu sempre notei que bichos tem sobre humanos. Eles não mentem.

Já casado, morando no Leblon, (talvez até já descasado, nem lembro), eu comprei um canário cor de cenoura. O nome dele era meigo: “Pim-pim”. Era uma boa companhia e comia mais cenouras que o Pernalonga. Um dia voltei do trabalho e a gaiola estava aberta. E o canário não estava mais lá. Acho que chorei um pouco.

Quando cheguei em Nova York, aluguei um quarto na casa de dois caras que pouco lá paravam de dia. Mas tinham um cachorro: “Montgomery Clift”. Monty foi o meu primeiro amigo nos Estados Unidos. Levava ele pra passear no Riverside Park, e foi muito graças à ele que comecei à me sentir em casa por lá. Os caras já estavam até com ciúmes. Eu não tenho ciúmes dos meus bichos. Eles ficam amigos de todo mundo e eu gosto de ver isto como um “pai” orgulhoso.

Em 1985, eu morava já em Greenwich Village, e tinha uma loja de presentes que era de uma dominicana italianizada por anos vividos na Itália (só em Nova York a gente encontra gente assim) que vendia lindas peças de artezanato brasileiro po preços razoáveis. Era um lugar que eu ia muito quando tinha que comprar presentes, e também pra bater papo pois a dona era boa de papo. Ele tinha uma gata siamesa na loja que eu sempre acariciava. Um dia fui lá e a gata não estava na área. Perguntei pela bichana e a dona me levou para o fundo da loja onde a siamesa amamentava uma ninhada de seis. Ela me ofereceu um. Eram 4 com aquele pelo e cor de siamês mesmo e dois rajados. Na hora que eu estava olhando, um dos rajados fez um estertor e eu entrei numa que ele sorriu para mim. Eu disse: “I want that one!”. Mas aquele bichinho já estava prometido. Eu fiquei bolado.

Por sorte, estava pra se realizar a anual festa brasileira da rua 46, e uma amiga tinha uma barraca lá. Coloquei as duas em contato, e acabei ganhando o gatinho que eu queria. Deixei passar as 8 semanas de amamentação, comprei comida, caixa de areia, brinquedos e finalmente a dominicaitaliana chegou trazendo o felino numa bolsa. Ficamos enfim sós. Depois de muitas décadas finalmente eu tinha um gatinho. Botei o nome muito óbvio de “Garfield”.

E chamava pelo nome ou simplesmente de “tsitsa” (que é gatinho em húngaro e escrito “cica” mas eu não pensava como a marca indica). Uma noite eu cheguei do trabalho e o bichinho passeou no sofá acima do meu ombro. Foi quando notei, surpreso, quase estarrecido... que não era um gato, mas uma gata! E eu disse: “Garfield.. you are a girl”. E ela me olhou com uma cara de “of-course-I-am”. Não ia chamá-la de “Garfielda” porque seria sacanagem, e escolhí uma grafia fonética americana com jeito interplanetário: Tzee-Tzah!

Tzee-Tzah ficou famosa entre os famosos e os não famosos que me visitaram nos Estados Unidos. Era linda, dengosa, reservada, engraçada. Sempre que viajei alguém se “mudou” para o meu apê pra cuidar dela. A mudança do estúdiozinho da Rua 8 parao estúdio maiorzinho da Rua 25 tirou a panorâmica que ela tinha da janela, mas deu novos espaços para a gata. E quando nos mudamos para Connecticut ela veio nervosa mas se adaptou logo.



Faltando uma semana para o meu aniversário em 1999 eu resolví me dar um som novo de presente. Fui no shopping. No shopping tinha uma loja de animais que eu sempre espiava quando ia lá. Desta vez tinha um husky castanho de olhos azuis que olhou pra mim com uma cara de “aí que tédio, mais um que só olha”. Ele parecia um morcêgo porque ele tinha 3 meses mas as orelhas já eram longas como se adulto fosse. Eu pedi pra tirar ele da gaiola. Bastaram alguns minutos e resolví que ia ficar com meu som velho e comprar o husky. Era época de Copa Stanley. Primeiro pensei em chamá-lo Stanley. Mas logo resolví homenagear o melhor jogador de hóquei de todos os tempos e q eu nome melhor para o meu husky do que... Gretzky!?

Coloquei ele na jaulinha nova q tive que comprar até ele ser treinado na parte de baixo da casa, onde era meu escritório e sala de tv. Estava no computador quando a Tzee-Tzah desceu toda sestrosta e deu de cara com a figura. Ela olhou pra mim, me xingou de babaca em idioma felino, e voltou lá pra cima. Com o tempo eles acharam a coexistência pacífica. Se o Gretzky chegasse muito perto ela fazia uma cara de onça pra ele e ele mudava de idéia. E afinal, só ela que podia dormir na minha cama.

Um dia ela perdeu o movimento numa pata. Estava chegando o fim do seu ciclo. Levei no veterinário, era cancer. Voltei arrasado. Tentaria um outro veterinário no dia seguinte. Nesta noite, que seria a última da Tzee-Tzah, o Gretzky subiu na cama e começou a lambê-la. Ela deixou. Do jeito deles eles também se amavam.


Depois ele passou a dormir na cama. Gretzky adorava pessoas e cachorros. Era amigo dos cachorros da vizinhança. Era amigo dos meus amigos. Era amigo dos churrascos que o Markito fazia. Gostava de ouvir o Reginaldo Faria tocar violão nas suas visitas à Bristol.

Em 21 de março de 2005 ele fugiu, atraído pelo cheiro de uma cadela. Foi atropelado e morreu à caminho do hospital. Nem preciso dizer o que sentí. Mas no dia 25 eu coloquei este post no meu fotolog:

“Não existem substituições. Gretzky, primeiro cachorro da minha vida, vai sempre ser guardado no meu coração, como a minha gatinha Tzee-Tzah. Depois de 20 anos tendo bicho, passei 3 dias de grande vazio e sofrimento. Esticar a dor é uma auto-punição quase sempre desnecessária.

Hoje foi dia de folga. Conselhos de família e amigos me fizeram entrar no meu carro e ir para uma cidade próxima onde fica a sede da "Humane Society", uma organização sem fins lucrativos que busca achar lares para animais que não os tem. Estava ainda (pelo menos pensava) hesitando em adotar um outro animal, mas me deixei seguir os sentimentos.


Poderia ter voltado pra casa com uns 4 cachorros e 3 gatos (já que não haviam elefantes para adoção). Mas voltei com um, que com olhos cor de mel, açucarou meu coração. Um bulldog misto com labrador. Ele é dourado :)

Amigos, deixem-me apresentar Joe Montana (era "Harley"). JOE para os que serão íntimos.

Ele está feliz na casa e a casa esta de novo com cara de lar. Ele é também uma homenagem ao Gretzky.”


Pois Joe está comigo há dois anos. É amigo dos meus amigos que o conhecem. Gosta de gente e de cachorros. Nascido na Carolina do Norte, veio parar na Hungria. Entende inglês, português e húngaro. Está feliz. Fez amizade com Bucsi, o cachorro dos vizinhos e ambos passam horas brincando ou morgando. Aqui e lá. E é meu melhor amigo.

E os bichos não mentem.



DENUNCIE SEMPRE QUALQUER CRUELDADE COM ANIMAIS ÀS AUTORIDADES COMPETENTES.

Wednesday, March 21, 2007

Esta é a verdadeira história do jogo de NFL que o Marco Alfaro fez sózinho porque eu atolei na neve (ou “O Show não pode parar! II”)

Dezembro costuma ser muito cruel em toda a área da Nova Inglaterra e em 2003 não foi diferente. Era o domingo da Semana 15 da NFL, e estava nevando muito em Bristol, Connecticut. Para mim o dia estava sendo um pouco mais doloroso porque me refreei em tomar os medicamentos contra dor que haviam me receitado quando sai do hospital, depois de atroscopia no ombro direito.

Meu sobrinho Marcio foi para os Estados Unidos com a mulher e o filho para cuidarem de mim na recuperação. Pouco me lembro daqueles dias, pois aproveitei para dormir o máximo, sob efeito dos medicamentos, pois a dor era muito grande. Ainda mais porque a minha tendência é dormir sobre o ombro direito.

Eu havia protelado a cirurgia um bocado. Tudo começou quando fui pendurar um quadro com pesada moldura de vidro, e feito um panaca subí numa cadeira de pernas finas no lugar de usar a minha escadinha. A cadeira escorregou e eu caí. Aterrissei com ajuda da mão esquerda, enquanto com a direita mantive o quadro no alto para que não se quebrasse. Ele não se quebrou. Mas eu torcí o braço e com o tempo desenvolveu-se uma tremenda tendinite.

O ortopedista me deu uma injeção de cortisona e isto quebrou um galho por um tempo. Passados alguns meses voltei pedindo outra. Ele me deu, junto com o aviso que não poderia me manter assim e que provávelmente teria que me operar. A cortisona segurou a barra mais um tempo. Mas depois as dores eram brabas. Coisa de eu estar conversando na boa e de repente pintar um “ai!”. Coisa de eu estar narrando na cabine segurando o braço.

Chegou um ponto que não dava mais para protelar. Marcamos a cirurgia para coincidir com as férias do Marcio. Mas já era 14 de dezembro e meus sobrinhos haviam viajado na véspera. Tudo bem. Eu estava vendo trechos dos jogos do dia com enfâse especial em Jacksonville Jaguars vs. New England Patriots, e Pittsburgh Steelers vs. New York Jets, pois o nosso primeiro jogo da semana seguinte seria Patriots vs. Jets, sempre um clássico mesmo com o Patriots disparado no topo da tabela.

Já estava com a minha preparação para o jogo da noite prontinha, New York Giants vs. New Orleans Saints. Tava tudo muito bom, não estava sentindo dor mesmo tendo parado os remédios na véspera. A única coisa era a neve que não parava de cair fazendo montes do lado de fora da minha casa. Mas meu “Yellow Submarine”, meu Pontiac Aztec, era poderoso e as ruas e estradas habituais da minha casa para a ESPN não eram preocupantes. Eu estava mais preocupado era com os detalhes que poderiam fazer o jogo interessante para os brasileiros torcedores do Giants, que já estava eliminado. O Saints ainda podia acalentar remotos sonhos de playoffs à caminho do Super Bowl XXXVIII com uma vitória que parecia provável.

Fui para a garagem e entrei no carro. O braço não estava incomodando. Logo que sai da garagem saquei um problema. O tanque de gasolina estava lá embaixo. Foi aí que tomei a decisão errada. Resolví mudar o roteiro (estava com tempo para isto) e ir por um outro onde acharia um posto de gasolina mais próximo onde poderia chegar cortando caminho pelo estacionamento de um supermercado falido. O estacionamento estava coberto de neve (que alías não parava de cair). Atolei.

Terrível vontade de ir ao banheiro. Ansiedade. O que fazer?, pensei. Ou rezei. E aí me apareceu o que eu primeiro pensei que fosse um anjo, mas depois se provaria o diabo. Um cara viu um borrão amarelo na neve e quando percebeu que era um carro veio me ajudar. Deu pra sair. Agradeci e dei meia volta e ia rezar para que a gasolina bastasse até o meu posto habitual, mais próximo da ESPN.

E na ruazinha que me levaria ao tal caminho tinha um posto de gasolina do qual havia me esquecido. Seria um alívio duplo. Só que a neve cobriu uma moita de plantas na entrada, e eu fui direto em cima. Atolei, mas tirei o carro e estava já usando a bomba quando apareceu um carro de polícia. Por uma coincidência nefasta, o cara que tinha me ajudado há minutos estava no posto e quando viu eu entrando pelo arbusto achou que eu estava bebâdo e chamou a polícia.

Cena habitual. Meus documentos estavam em ordem. Humilhante caminhada para ver se eu não trocava de pé. Bafômetro. Mas eu não estava preocupado com isto. Tinha zero de alcool no sangue. Meus olhos revelavam, talvez ainda um pouco vidrados pelos remédios ainda da véspera, o crescente nervosísmo com o horário do jogo se aproximando. O policial, lento de raciocínio e cultura, ficou ainda mais abismado quando eu disse que estava indo para a ESPN para narrar o Sunday Night Football para o Brasil. Eu acho que ele nem sabia o que era "um Brasil". Me controlei para não pegar um desacato, mas mesmo assim fui parar na delegacia.

Depois que me fotografaram (sorríndo, pois eu não iria fazer cara de culpado), o policial me disse que alguém teria que me buscar lá. Foi quando liguei para o Craig, que era o produtor do jogo e disse o que tinha acontecido e que não poderia chegar para fazer o programa. Só me deixaram telefonar quando faltavam menos de 10 minutos para o começo. Todo mundo já estava preocupado comigo. Foi quando pediram ao Marco Alfaro para fazer o jogo sózinho. Eu só soube, é claro, depois. Mas fiquei imensamente grato. Eu teria sofrido muito mais se soubesse que o pessoal no Brasil não pudesse ter acompanhado os 4 touchdowns do Joe Horn em português, com direito de ligar para a família depois do segundo, usando um celular que ele havia escondido no uniforme.

Ele pagou uma multa por isto, e eu paguei um mico pelas minhas desventuras da noite. Mas o Giants perdeu por 45 a 7, e eu perdí a fé na justiça. Eu estava apenas fazendo o máximo para ir trabalhar e fui impedido. Felizmente o Markito também acreditou que o show não pode parar!

FUTURAMENTE AQUI: Como fui meu próprio advogado :)

Monday, March 19, 2007

“O Show não pode parar!” (ou como “Ressucitei e narrei a Copa Stanley”)

Eu sou pontual. Minha mãe me ensinou isto. Ela aprendeu o valor da pontualidade com o meu avô. Não o conhecí, mas ouví muitas histórias dele. Um dos carros que passaram pela vida dele foi um Daimler vermelho. Era único em Zagreb, na Croácia. De origens humildes, meu avô chegou por meios próprios à ser uma pessoa muito conhecida e de bens na antiga Iugoslávia. E uma de suas características era a pontualidade.

Uma vez, quando adolescente, eu estava com amigos e fomos tomar um cafézinho num botequim qualquer do Posto 6. Tinha um senhor um tanto embiritado que entrou no nosso papo. Simpático, tinha um sotaque engraçado em português. Perguntei de onde ele era e ele era de Zagreb. Era o Alexandre Horvat. Eu o conhecia de nome pois foi diretor de arte de dezenas de filmes brasileiros.

Conversa vai, conversa vem eu disse que a minha mãe também tinha nascido em Zagreb, e se por acaso ele teria conhecido o meu avô, que em algum momento foi o Presidente do Automóvel Clube de lá. Perguntou o nome e eu dissse: Edo (Eduardo) Funk. O homem arregalou os olhos e perguntou: “Você é neto de Edo Funk?” E me olhou quase como se eu fosse um E.T. (coisa que não garanto não ser)... Pequena pausa para uma informação ao leitor: Pronuncia= “Fúnk” e não “Fânk”, apesar de eu ter algum rítmo no sangue.

Mas então, o tal Alexandre me contou que o meu avô tinha um Daimler vermelho e que era único em Zagreb. E que ele era tão pontual que as pessoas sabiam exatamente que horas eram ao ver passar o carro dele pelas ruas à caminho do trabalho. Um dia o velho resolveu mandar pintar o Daimler vermelho de cinza. Houve um abaixo-assinado pedindo para ele pintar o carro de vermelho de novo, coisa que ele fez.

Achei muito interessante, mas não sabia se o Alexandre estava tirando onda com a minha cara ou se era a birita do botequim que estava contando aquela história. Fui conferir com a minha mãe e era verdade. Depois disto o Alexandre Horvat foi convidado à jantares com a minha família e nos tornamos bons amigos. Chegamos até à trabalhar juntos em cinema alguns anos mais tarde.

Mas eu ja era pontual e tinha um senso de responsabilidade. Afinal, não tinha como não ser pontual quando se fazia tv ao vivo. Outra coisa que sempre tive dentro de mim foi “o show não pode parar”. Tanto que aos 15 anos, fazendo uma peça no Teatro Rival com Alda Garrido (que já é nome de rua na Barra há anos), fui trabalhar num sábado com 39 graus de febre. Era uma vesperal e dois espetáculos noturnos de uma peça de 3 atos, dos quais eu não estava em cena apenas uns 10 minutos no 3º ato. A peça, “Miquelina” de Pedro Bloch, era um grande sucesso e eu não iria decepcionar o público. Eu fazia o filho da Miquelina.


A minha própria mãe morreu em 1993. Eu estava na ESPN, eram cerca de 6 da tarde, e eu tinha um jogo de boliche e uma luta de boxe para narrar. Nesta época eu ainda morava em Nova York, e passava 4 dias por semana num hotel em Bristol (a cobertura em português da ESPN ia só de quinta-feira à domingo). Desespero. O último avião para o Rio sairia de Kennedy 2 horas depois. Eu não estava com meu passaporte e não havia condições de ir buscá-lo e chegar no aeroporto em tempo. Era destino. Eu não poderia ir no enterro da minha grande amiga.

Meg Green, supervisora, me deu colo e Bernard Stewart, hoje Vice Presidente da ESPN para Ásia, e na época o nosso big boss veio me apoiar. Ele havia perdido um filho jovem naquele ano com um ataque de coração numa quadra de basquete, e veio compartilhar alguns sentimentos. Ele me disse para que eu me tratasse com muito carinho e até egoísmo se preciso. Eu agradecí e disse que estava na hora de ir para o ar. Ele não queria que eu fosse. Eu fui. Quando o Bernard saiu do nosso departamento foi triste. Nunca mais tivemos um diretor do seu naipe humano.

Pois eu narrei o tal boliche e se alguém assistiu jamais saberia que havia qualquer problema comigo. A não ser a colega ao meu lado, pois eu não falava nos intervalos comerciais. Eu estava gelado. Achei que não poderia inflingir aquela minha tristeza à mais ninguém e mandei avisar ao José Inácio Werneck que eu aceitava a oferta que ele tinha me feito para ir ao ar sózinho com o boxe. Mas não foi fácil para mim.

Em 1996 eu morrí. Eu tinha tido um dia de folga e passei umas 11 horas no computador (ainda brinquedo novo) e de repente dei por mim no chão com a cadeira na cabeça. Havia desmaiado. Levei um susto, achei que tinha ficado tempo demais na internet. Feito uma criança que faz uma “arte”, desliguei o computador, tomei um chuveiro e fui para a cama. No dia seguinte acordei cedo e tonto. Liguei para o Tim, um colega americano, e pedí pra ele me levar ao hospital pois não me sentia seguro para dirigir.

Cheguei no hospital, e tentando ser discreto eu disse sorríndo que estava lá porque havia desmaiado na véspera e estava meio tonto. Imediatamente começaram à agir. Comecei à sacar que poderia ser algo mais complicado do que horas demais no computador. Quando estava deitado, com a enfermeira tirando sangue e eu falando... de repente apagou tudo. Eu estava em algum lugar dentro de mim mas não sabia aonde. Parecia que havia tomado uma anestesia geral.

Quando voltei à mim estava rodeado por médicos e enfermeiras e eu só disse: “I lost my train of thought... (perdí o fio do meu pensamento)”. O cardiologista disse que é claro que eu perdí porque tive uma parada cardíaca de 5 segundos. “Você morreu e voltou”, ele disse. Ele disse que eu teria que ser internado. Eu disse que negativo. Era 4 de junho e eu iria narrar o Jogo 1 entre o Colorado Avalanche e o Florida Panthers nas finais da Copa Stanley. O médico, Dr. John Frazier, me deu um esporro dizendo que em 97 teria uma outra Stanley Cup, mas se eu não ficasse no hospital não teria um “eu” para narrar. E ligou para a ESPN avisando.

Eu achei tudo muito chato, pois já estava me sentindo perfeitamente normal. Enquanto isto eles já estavam falando em cirurgia no dia seguinte para colocar um marca-passo. No dia seguinte eu disse que não ia botar marca-passo nenhum porque no meu “hard-drive” ninguém mexe. O médico me perguntou se eu queria uma segunda opinião. Então eu pedí para ele ligar para a minha ex-mulher que estava na época morando em Miami para pegar o telefone de um ex-colega de turma dela no Brasil. Cláudia era estudante de medicina quando casamos, e o melhor aluno da turma dela era o Sérgio Kaiser. Eu sabia que fosse qual fosse a especialidade dele, ele seria dos melhores da profissão.

Para a minha sorte, o Dr. Sérgio Kaiser tornou-se um grande cardiologista. Meu médico ligou para ele e conversaram. O Sérgio perguntou se tinham feito um certo teste comigo. Não tinham. Me mandaram de ambulância para um hospital ainda melhor equipado em Hartford. Depois do teste viu-se que não precisava de marca-passo nenhum. Eu nascí com a minha válvula tricuspíde apenas bicuspide. E apesar de ser cuspíde de Gemeos e Cancer isto não quebrava o galho. Mas enfim, com o atenolol nosso de cada dia isto tornou-se um problema sem problemas, lol.

Nisto o Colorado Avalanche já havia vencido o Florida Panthers nos dois primeiros jogos (3-1, 8-1) e eu seco pra voltar para a cabine. Tive alta e no sábado já estava no ar (o Ivan Zimmermann narrou, só me deixaram comentar pra eu não me emocionar muito) e o Avs venceu de novo por 3-2. Como é uma série de melhor de 7, mais uma vitória e bastaria. Na segunda, 10 de junho, o ex-Quebec Nordiques teria a chance de vencer a sua primeira Stanley e eu já estava inteirão e narrando e vibrando com cada dos 7 power-plays da partida com os jogadores “kikados e banidos para o banco de castigo”, com as “defesas beleeeeeeezas” de John Vanbiesbrouck e de Patrick Roy, “o rei dos goleiros”, e só faltava gritar um gol.

Com mais de 5 horas de duração, o jogo foi a terceira mais longa partida da história da Stanley, e só se resolveu na 3ª prorrogação com um gooooool de Uwe Krupp para o Avalanche. 6 dias depois dos meus 5 segundos de morte. No dia seguinte a primeira preocupação do Werneck foi ligar para a ESPN para saber se eu ainda estava vivo após a maratona no ar. Acho que tem galera amarradona na NHL no Brasil que tem este jogo gravado. E depois, como bem disse o Dr. Frazier, eu tive mais Copas Stanleys para narrar nos anos seguintes. E tenho o gostinho de ser (ao menos até hoje) o único narrador à narrar as vitórias finais da Copa Stanley para o Brasil. E pontualmente.

BREVE: A verdadeira história do jogo de NFL que o Marco Alfaro fez sózinho porque eu atolei na neve.

Thursday, March 15, 2007

Muitas verdades são inconvenientes...

Assistí em DVD, o documentário vencedor do Oscar este ano, “Uma Verdade Inconveniente”. A minha admiração pelo ex-vice presidente americano não pára de crescer através dos anos. Acho que viveríamos tempos melhores no nosso planeta se George W. Bush tivesse falhado no vudú eleitoral judiciário da Flórida.

Mas isto foi no começo deste século e Al Gore pensa e nos faz pensar mais à frente. A ficha tem que cair para todo mundo ou o mundo não terá fichas para levar o jogo muito mais adiante. O melhor de tudo isto é que cada um de nós pode fazer alguma coisa para reduzir o super-aquecimento global. E eu vou prestar mais atenção no meu cotidiano para ver o que eu posso fazer de minha parte.

O título do filme não poderia ter sido melhor escolhido. Por que quem quer lidar com o que é inconveniente? O inconveniente é chato. Tem que ser lembrado em horas confortáveis, todo mundo já lida com tantas coisas desconfortáveis sem opção.

A outra coisa é que um comportamento mais responsável com o meio-ambiente não traz uma gratificação instantanêa. É cuidar do futuro, e mais do que tentar evitar os furacões e tsunamis mais próximos, é pensar 50 anos pra frente. E para a galera da minha geração que não tem mais 50 anos pela frente é um exercício para beneficiar um planeta que já teremos deixado.

Depois de ver o filme é difícil evitar, no entanto, o pensamento de que é um crime não fazer absolutamente nada pessoalmente. É quase como cometer um genocídio com as crianças de hoje e seus filhos.

Em 1989, eu tive o privilégio de fazer a voz de Chico Mendes em inglês para o documentário “Voice of the Amazon” de Miranda Smith. Um trabalho do qual me orgulho em ter participado, e que foi exibido na TBS e na TNT. O filme é narrado pela vencedora do Oscar de atriz coadjuvante de 1984, Linda Hunt. Eu já tinha tido o prazer de conhecê-la anteriormente através da autora teatral inglesa Caryl Churchill.

Conto isto porque hoje me lembrei muito deste filme sobre o herói brasileiro. Al Gore, então Senador, participa dele com depoimentos. Gore homenageia Chico Mendes. Ele nunca perdeu uma oportunidade para reconhecer os melhores esforços pelo o bem estar coletivo.

Uma coisa que não pude deixar de notar foi como ele está absolutamente confortável com a camera. Inclusive com as tiradas de humor. Na campanha presidencial ele geralmente quebrava a cara quando tentava ser engraçado, e tentava criar diversas imagens de si para ver qual agradaria. Para mim a tirada mais engraçada do filme é quando ele se apresenta e diz que ele costumava ser “o próximo presidente dos Estados Unidos”!

Pois é. Se ele tivesse sido eu acho que o mundo estaria menos poluído. E a política americana também.

Wednesday, March 14, 2007

Um recado de um jovem poeta.






Uma poesia que escreví em 1967, quando eu tinha 23 anos, e fazia recitais de protesto onde me deixassem. Neste, a presença do grande pianista Bené Nunes (em primeiro plano na foto) foi um detalhe. Mas parece que os protestos não adiantaram nada.



Ah, seu moço, eu não quero guerra não.
Ainda quero ir longe,
bem além do fim do mar.
Quero ver o que restou
do Egito que acabou.

Ainda quero ver a Lua,
e de lá escrever à Terra
toda uma ode em seu louvor.

Moço, eu não quero sua guerra não!
Tem tanta canção que ainda não cantei.
Tanto o que dizer, e ainda nem falei.

Quero encontrar a minha mulher amada,
que há tanto é esperada.

E depois, seu moço,
ainda não plantei nenhuma árvore,
não escreví nenhum livro.
E ainda não fiz nenhum filho.
Sua guerra vai ter que esperar.

Meus amigos, seu moço,
ainda não acharam o caminho para trilhar.
Se eles ainda estão na procura,
como pode, seu moço, a sua guerra começar.

Começar antes que se cure o cancer.
Antes que o sol levante para o futuro.
Seu moço, a sua guerra vai fazer o futuro passado.
Vai tirar a vontade de sorrir.

E meu amor, seu moço,
talvez nem dê tempo de eu amar.
Seu moço, entenda bem, e ouça e preste atenção.

Seu moço, eu não quero a sua guerra não.
Seu moço, olhe que guerra não é novela de televisão.

Tuesday, March 6, 2007

“A Nova Estrela” chega à televisão!


Eu fiz a cama na varanda... e ajudei assim e assado na produção de Todas as Mulheres do Mundo, de Domingos Oliveira e depois disto eu já havia colaborado no roteiro de 3 filmes: Os Paqueras, de Reginaldo Faria, Pais Quadrados, Filhos Avançados, de J. B. Tanko, e O Bolão, de Wilson Silva. Já havia sido assistente de produção em A Penúltima Donzela, de Fernando Amaral, já tinha sido 3º assistente de direção (ou contra-regra, claqueteiro, sei lá o que fui!) em Roberto Carlos e o Diamante Cor de Rosa, de Roberto Farias. Havia terminado de rodar como assistente de direção o maravilhoso filme Em Família, de Paulo Porto. Eu tinha 26 anos e estava louco para dirigir um curta metragem.

Eu tinha 26 anos e fazia parte de uma turminha maravilhosa que se reunia todos os dias, a maior parte deles na casa do Paulinho Mendonça e da Maria Alice Langoni. A casa deles era para todos nós um segundo lar (ou quem sabe o primeiro). Reginaldo Faria, ainda casado com a Kátia (mãe do Régis e do Marcelo), Claudio Tovar, Luiz Fernando e Luhli (que ainda não usava o “h””), Ney (que ainda não era Matogrosso), Ricardo Bicca, Regina, Bevi, Berilo Faccio, Wagner Mello, e mais umas pessoas eventuais e incríveis.

A gente conversava sobre tudo, mas sempre sobre cinema e música. E teatro. E a gente cozinhava em revezamento e comia muito. Da culinária mais simples à mais esotéricamente comprometedora. Muitos filmes brasileiros fazem alusão em piadas particulares, à membros desta turminha. Muitas grandes idéias surgiram e foram filmadas e exibidas. Eu tenho um amor eterno por estas pessoas, nos encontramos através das décadas (foto já da década de 80: eu, Claudinho e Ceninho sentados esparramados, Paulinho no meio, e Regi no vértice deste triângulo de amigos) e muitas histórias da minha tribo cósmica ainda vão ser contadas aqui. Naquela época, a gente fazia também revezamento de casas às vezes. Casa do Regi. Casa do Luiz Fernando e da Luli em Santa Teresa. Com visitas de Luiz Carlos Sá .“Ah, Teresa, minha santa Teresa”.

O Luiz e a Luhli tinham também uma casa em Filgueiras, na baia de Sepetiba. A primeira vez que fui lá eu acabei terminando um namoro com uma namorada canadense que não sacou a magia do lugar, e portanto eu resolví que ela não combinava com a paisagem. E se não combinava com a paisagem, não combinava comigo. Eu tinha 26 anos. Fazíamos passeios de barco na região. Luiz Fernando era fotógrafo e de um dom extraordinário.

Tania Scher, lindissima, também estava muito na área. Tinha estrelado o tal de O Bolão, junto com meu amigo e parceiro Taiguara, tinha trabalhado em Tem Banana na Banda, com a Leila Diniz no Teatro Poeira de Ipanema, onde às tardes passava a peça infantil Pop, a Garota Legal, de Ronaldo Ciambroni, que eu havia dirigido com a irmãzinha da Leila, Lígia Diniz, e ainda a Maria Alice, e o Claudio Tovar estreiando em teatro no Rio. Parecia que tudo que rolava era uma extensão das nossas festas. E às vezes o começo delas. E eu tinha 26 anos. E estava louco para dirigir um curta metragem.

Uma noite fui assistir um show da Gal Costa no Teatro Opinião. Ela era acompanhada pelo grupo Som Imaginário, que trabalhava muito com o Milton Nascimento, e era composto por músicos da pesada. Wagner Tiso, que acompanhava Milton Nascimento desde o início de carreira, o baterista Robertinho Silva e o baixista Luiz Alves. O guitarrista Frederyko (vocalista também), Tavito e seu violão de 12 cordas, Naná Vasconcelos na percussão, e Zé Rodrix no orgão e vocais.

Depois do show fiquei de papo com o Zé Rodrix, que eu já conhecia desde os tempos que ele era do Momento Quatro, quando cantava no programa “Fahrenheit 2000” do Taiguara e da Eliana Pittman, para o qual eu fazia uns textos na TV Tupi. Alías o Zé era meu fan confesso dos tempos que eu trabalhava no “Falcão Negro” na Tupi e sempre se divertia em pronunciar meu nome em húngaro.

Conversa vai, conversa vem, bateu o estalo do curta que eu queria fazer! Um filme com o Som Imaginário. Numa época em que ninguém imaginava sequer que um dia existiriam video clipes, foi um estalo de idéia. Tinha uma música linda do Wagner, com climas diferentes, numa progressão que ia do romântico ao místico. Uma viagem. Viajei nela. Tinha um texto do Fredera (Frederyko) que dizia que era o “tempo da nova estrela” e assim por diante.

A minha idéia era começar com imagens do conjunto acompanhando a Gal (ela topou participar num take, que era tudo o que eu precisava), e depois na progressão da música explodir para a liberdade de tomadas externas. Nos lugares lindos onde eu ia com o Luiz Fernando e a Luli. Claro que a Direção de Fotografia tinha que ser do Luiz. Bem, todo mundo topou a idéia, inclusive o Milton Nascimento. Ouví a música inúmeras vezes, com o texto do Fredera. Num certo ponto precisava de uma mulher linda, uma figura mágica para dar um clima Iemanjá, pois as imagens seriam de muito mar. Ela faria a oferenda (que foi caprichadamente armada pelo meu irmão Jorge) e sumiria no próprio mar. E tinha que ter uma criança que seria a própria expressão de uma nova estrela. Fácil, Tania Scher e sua filha Claudinha que tinha 2 anos e era de uma doçura mágica.

Tudo muito bom, mas cinema sempre custou dinheiro. Fomos papear com o meu amigo Carlos Eduardo de Andrade, que na época tinha a boutique Aquarius (bem adequado) e gostava de cinema, e sabia lidar com bancos. Meu amigo David Havt ia entrar na produção, com negativo mas na hora não rolou. Foi quando eu conhecí o Pedro Carlos Rovai. Fomos bater na porta da Sincro Filmes, e ele arrombou a própria geladeira e nos emprestou duas latas de Eastmancolor de 35mm. Depois o Pedro e eu ficaríamos amigos e eu seria também o seu assistente de direção em A Viúva Virgem e Ainda Agarro Esta Vizinha.

E aí a notícia! A Censura Federal proibiu o texto do Fredera. Subversivo. Estrela deve ser comunista! O meu roteiro tinha sido bolado em cima da música e do texto. Que fazer? Bem, vamos em frente assim mesmo!

A gente já tinha filmado em preto e branco, 16 mm para ser ampliado e granulado, as tomadas no Teatro Opinião, com direito à apoio moral da Lucina (que na época usava “h”), e fomos pra Filgueiras. Luli, que se consagraria depois como compositora, foi minha assistente de direção, cuidando da continuidade daquela viagem visual.


Quem tinha namorada levou namorada, quem tinha esposa levou esposa. Um astral maravilhoso. Lizzie Bravo, na época casada com o Zé Rodrix, ficou grávida de sua filha Marya nesta viagem. Tavito e Zé Rodrix começaram à ter idéias para comporem "Casa no Campo" nesta viagem. Mas teve a francesa!



Uma das locações era uma ilhazinha que a gente descobriu e quando estávamos prontos pra filmar apareceu a francesa que era dona da ilha (que a gente nem sabia que tinha dono), viu um monte de barbudos (quase todos usávamos ornamentos capilares faciais), umas moças aproveitando para um banho naturista, e não quis que gente filmasse na ilha dela. Eu tentei primeiro ser gentil como se ela fosse a própria Madame Vincent do livro de G. Maugier, usado na Aliança Francesa. Não colou. Perguntei se ela não gostava de "Travessia" de Milton Nascimento que ela certamente conhecia de festival na televisão - olha ele aqui com a gente! A francesa não amoleceu. Eu sei que acabei destratando a Mata Hari, que ameaçava ligar para o DOPS. Sugerí que ela seguisse o exemplo de Villegaignon em 1558 e voltasse pra França. Lembro que ela tirou uma foto minha para me “fichar”, mas eu dei um adorável sorriso para a camera dela fazendo um “V” de paz com a mão.

De qualquer modo, haviam as outras locações maravilhosas em Mangaratiba, inclusive um areal onde as gaivotas pousavam e sobrevoaram sobre a galera do conjunto na hora certa. Foi uma operação silenciosa armar a camera à distância e levar o pessoal de barco para a ponta de areia.

A última tomada do filme foi feita num travelling (nada fácil de montar na areia) e foi o fim do negativo. Não dava pra repetir.

Mas o material ficou ótimo, e a gente já estava combinado com o Egberto Gismonti pra fazer um curta com ele. Teria sido lindo. Mas não havia MTV. Menos ainda Canal Brasil. A Nova Estrela teve teve então a sua estréia para público. Foi para convidados no Cine Jóia, um dos menores que já existiram no Rio, e ficava no mesmo shopping onde o Carlos Eduardo tinha a sua boutique. Não havia lei de obrigatoriedade para curtas, e os exibidores brasileiros práticamente só passavam filme nacional quando obrigados por lei. Mesmo assim, eu inscrevi o filme e o INC (Instituto Nacional do Cinema) o escolheu para representar o Brasil no Festival de Berlim. Não aconteceu nada, mas a lata fez uma bela viagem de ida e volta à Europa!

Poucos anos depois, o Gil Lopes (que se tornaria empresário de músicos de uma gama indo de João Gilberto aos Engenheiros do Havaí), ainda garoto e Ceninho para os íntimos, levaria uma cópia para passar entusiasmadamente na sua faculdade. Em 1976 eu dirigí um longa, Nem as Enfermeiras Escapam, e como era habitual o filme teve uma pré-estréia para a classe cinematográfica e artística. Foi no cinema Leblon II que estava novinho. Eu fiz questão de passar o curta antes. Foi para mostrar o cinema que eu gostaria de fazer em contraste com o cinema que me foi permitido fazer.


A outra exibição internacional do filme foi no cinema do Public Theatre, em Nova York, nos anos 80. Eu tinha uma velha cópia em 35mm e estava com saudades do filme. Foi uma exibição ultra privê... só eu e o Fabiano Canosa. Fabiano era o programador do cinema. Infelizmente a cópia estava arranhadíssima, com pulos de fotogramas e cheia de óleo. Não dava para exibir.

Através dos anos a Lizzie Bravo sempre me botou pilha pra arrumar uma cópia do filme. Uma vez, quando almoçamos com o Bituca em Nova York, ele me disse que nunca conseguiu ver o filme. Puxa, Milton Nascimento tinha que poder assistir! Isto foi ainda nos anos 80.

Poucos dias depois que cheguei em Budapest no ano passado, uma surpresa no correio! Paulinho Mendonça me mandou um DVD da “velha estrela”, descolorida pelos anos, mas trazendo a evocação de uma época importante. Pena que o som (logo o som!) estava enervantemente distorcido. Mas deu para eu ter uma alegria muito especial, e depois dar muitas risadas. Não lembrava o porque de algumas coisas.

Mas entra em cena, ou melhor em Skype, a Lizzie. Ela me arrumou e mandou o mp3 da trilha original... com o texto do Frederyko. Eu resincronizei no computador e finalmente me lembrei do meu filme. Coloquei no You Tube. Paulinho e Lizzie foram das primeiras 1737 pessoas que assistiram antes de eu bloquear por um tempo.

E por que o bloqueio? Porque finalmente, três décadas e meia depois, na segunda-feira 12 de março de 2007, Canal Brasil, 19hs... A Nova Estrela chega à televisão! Nunca menos de 9 minutos levaram tanto tempo para serem mostrados para tantos. E acho que para muitos está viagem será um presente. Para mim, certamente é.
Eu tinha 26 anos. Eu tenho 62 anos.

PS em 19 de março. O filme já está desbloqueado no YouTube.

Eu gosto de frango assado embiritado!

Quer dizer... eu não tenho que estar embiritado pra gostar de um frango assado. Mas respeito as preferências de cada um! Todos temos direito ao nosso corpo. E me refiro ao nosso frango. Afinal, já parei de escrever pornochanchadas há muitos anos!

Mas este frango é o seguinte. Primeiro você lubrifica ele bem caprichado com um creme de cebolas, manteiga, sal, pimenta e manjericão. Você tem que enfiar a mão lá dentro e passar o creme com muito carinho. Juro que não vai arder. Aí é a hora de botar o seu toucinho lá dentro. Picadinho.

Depois você cobre o buraco fechando as pernas. Ei! Continuo me referindo ao galináceo. Pode usar barbante ou um estilete. Como o frango tá mortinho, isso não é sado-masoquismo.

Depois você deita o bichinho numa assadeira já com um óleozinho. E aí dá umas furadinhas delicadas nele com um estilete e faz um creminho com mais manteiga e sal e manjericão e passa em cima. Deixa ficar um pouco para que ele possa absorver o gozo do tempêro.

Liga o forno, e vai descascar as batatas que já foram cozidas. Quando terminar de descascar, o forno já está quentinho para receber a travessa com o frango. Abra o forno e coloque a travessa. E vá checar email ou coisa assim.

Depois que você checar o mail é conveniente não entrar em nenhum papo no MSN pra não se esquecer do franguinho que já está suando um ínicio de sabor por todos os poros. É a hora de você fritar as batatas. Depois que elas estiverem fritas (mas não demais), dá uma olhada no frango que já deve estar com saudades do seu olhar cheio de desejo.

Bem, aí você usa o tempo como quiser porque eu já disse que respeito as preferências de cada um, e não vou dar palpites na sua vida. Quando você achar que o frango está quase pronto, você pega uma cerveja, brinda e divide ela com o frango, derramando-a sobre ele. A sobra você bebe porque desperdício é pecado.

Deixa mais uns minutinhos e coloca as batatas fritas para fazerem companhia ao frango, que já deve estar se sentindo mais solitário do que o bebâdo final da boite. Aí deixa mais uns minutos para que o frango e as batatas compartilhem uma orgia de sabores.

Depois, é só tirar do forno. E pronto. Vá curtir o seu frango assado em boa companhia!

Thursday, March 1, 2007

Húngaro já foi bom de bola!

Mas não é mais. Há muitos anos que o futebol húngaro entrou numa decadência que parece não ter volta. Difícilmente um jogador húngaro bom vai querer planejar uma carreira de ganhos limitados. E o mais estranho é que parece que o povo já se conformou. Mesmo a torcida mais inflamada, a do Fradi (apelido do Ferencváros) já gasta a sua adrenalina não no estádio, mas em badernas de rua nos protestos políticos. Como o que aconteceu em 23 de outubro do ano passado. E há rumores de repeteco em 15 de março, o próximo feriado na Hungria.

Uma das coisas que me deixou bastante impressionado foi o descaso que percebí na noite do jogo da seleção húngara contra a Turquia em outubro. Eu estava passeando na Praça Ferenc Liszt, onde iria encontrar com amigos para jantar. Um lugar muito animado, restaurantes maneiros um ao lado do outro, mesas cheias do lado de fora. Budapestianos e turistas misturados, mostrando uma variedade de tipos neo-felliniana. Eu notei que quase todos os lugares haviam televisores de telas planas, a maioria deles ligados em canais de esporte. Nenhum estava mostrando o jogo. E era a primeira vez que a seleção turca jogava em Budapeste. Bem, a Turquia acabou vencendo a partida por 1-0 com gol de Tuncay Şanlı. O fantasma do Sultão Suleiman, que liderou a conquista da Hungria pelo Império Otomâno em 1526 estava sorrindo nas arquibancadas do Estádio Ferenc Puskas. Os turcos mandaram aqui até 1699 e voltaram pra mandar no futebol. E desta vez o povo húngaro se importou bem menos.

Há um brasileiro naturalizado húngaro (o reverso de mim), que joga na seleção da Hungria, o Leandro de Almeida. Ele estava contundido e não jogou contra a Turquia, mas estava de volta para o próximo jogo da seleção em Malta. A Hungria perdeu de 2-1, e Malta obteve a sua primeira vitória na Liga dos Campeões da Uefa desde 1982. A Hungria perdeu o jogo e eu perdí um frila, pois estava com uma matéria sobre ele apontada com a ESPN Brasil, e evidentemente a matéria caiu.

Eu, pessoalmente, nunca fui muito bom de bola. Menino de pé chato, tive que usar palmilhas de metal do Dr. Shool até conseguir perder uma delas na engrenagem de um daqueles brinquedos de parque de diversões que ficam rodando e você não pode parar de andar para não cair e perder a palmilha do Dr. Shool. Mas mesmo assim eu jogava bola como qualquer outro menino. Geralmente como beque (ainda não existia a palavra “zagueiro”) porque eu conseguia atrapalhar todo mundo. Pena que atrapalhava meus colegas de time também.

Eu era Fluminense porque o meu pai era Fluminense (que tem as mesmas cores da bandeira da Hungria), até que em adulto num ato de liberação assumí que eu gostava mesmo era de torcer pelo Flamengo e virei casaca na moral. Eu já não precisava da mesada do meu pai mesmo. Mas só era torcedor apaixonado, como sou até hoje e semprei serei, pelo Brasil na Copa. Mesmo nas vezes em que achei intelectualmente que seria políticamente melhor para o país perder, eu nunca conseguí não torcer. Sofrendo, xingando e vibrando.

Mas em 1954 eu tinha 10 anos e não entendia ainda bem o que era a Copa do Mundo. Ainda era coisa de ouvir no rádio. Eu estava no quarto ano primário no Colégio Mello e Souza. Tinha entrado no colégio naquele ano, vindo do Colégio Anglo Copacabana onde estava desde o jardim da infância e tinha todos meus amiguinhos e amiguinhas. Mas como eu havia terminado a 3ª série com medalhinha, meus pais acharam que o colégio estava “fácil” demais para mim e me transferiram para o outro, aonde já estudava o meu irmão mais velho. Pois é.

Só que em 1954 a Hungria derrotou o Brasil nas quartas de final da Copa por 4-2, no que até hoje é lembrado como uma batalha campal em Berna, na Suiça. Com direito à muito barraco. Mas esta era Seleção Húngara histórica dos anos 50 que conquistou a medalha de ouro nas Olimpíadas, que ficou invicta por 29 partidas desde 14 de maio de 1950 até a final da desta mesma Copa de 54, quando perdeu para a Alemanha por 3-2 após o gol de empate de Puskas ter sido anulado pelo juiz inglês.

No dia seguinte ao jogo com o Brasil, eu cheguei no colégio e parecia que eu era um dos membros da “Seleção de Ouro”... todo mundo queria me dar porrada porque eu nascí na Hungria (nesta época eu creio que ainda falava português com algum resquício de sotaque estrangeiro). Foi “hórrendo”, como diria em bom baiano a minha querida amiga Regina Dourado. Por sorte, os dois maiores craques da turma, o Dori Caymmi e o Alvinho Burlamarqui eram dos meus melhores amigos.

Mas eu fiquei um bom tempo traumatizado. Preferia não jogar e os capitães preferiam não me escalar. Eu tinha medo que por ser húngaro pudesse jogar bem e ser recompensado com linchamento ou coisa assim. Passei à fugir de aulas de ginástica. Talvez isto explique a minha atual e inexplicável barriga que não é nem de cerveja e nem de gravidez embora pareça.

Tinha um monte de amigos nos times de praia de Copacabana. Radar, Dínamo, Capitães de Areia. Mas não entrei para nenhum deles e nem aceitei nenhum convite do famoso treinador Tião. Mas o futebol esteve sempre por perto. Meu pai era torcedor alucinado e tinha amigos naquela seleção húngara. Em 1957, eu já estava trabalhando na TV Tupi, e um grande amigo do meu pai foi trabalhar no Rio como técnico do América: Gyula Mandi.

Mandi havia sido o treinador da equipe comandada pelo grande técnico Gusztáv Sebes e o seu substituto. Ele jantava lá em casa umas três vezes por semana e para mim ele era apenas o Gyula bácsi (tio). Eles conversavam sobre Ferenc Puskás, Zoltán Czibor, Sándor Kocsis, Nándor Hidegkuti, József Bozsik e Gyula Grosics como eu converso sobre Reginaldo Faria, Paulinho Mendonça, Claudio Tovar, ou Luciana Quaresma, Marco Alfaro, e Roberto Figueroa. Eu estava era ligado em decorar meus textos pra tv.

Thomas, meu irmão, foi servir de intérprete para o Mandi lá na Tupi, numa entrevista num programa do Rui Viotti. Depois do programa, lembro até hoje, a gente estava já lá fora conversando animadamente. Eles entre si, e eu fazendo camaradagem com a galerinha do Golden Boys. Na volta para casa fiquei sabendo que o Rui havia convidado o meu irmão para trabalhar com ele, mas meu mano achou que já bastava um “artista” na família.

Só fui curtir com pessoal de futebol muitos anos depois, quando andava na praia em longos papos com o El Loco Doval, quando ele jogava no Flamengo e mais tarde com o Paulo César, que ainda jogava no Botafogo. Volta e meia ele aparecia pra ver as filmagens de A Viúva Virgem. E muitos anos depois, já em Nova York, com o Pelé em muitas festas e jantares, e ainda o capitão Carlos Alberto, na casa de Laurita Mourão. Ela merece um capítulo à parte depois.

Como já narrei toda a gama de esportes que a ESPN transmite, narrei também futebol. Inclusive uma temporada da Premiere League, com o José Inácio Werneck. Confesso que não contei com o incentivo dos colegas que queriam narrar bola redonda. Um dia me toquei que estava curtindo muito mais narrar futebol americano, hóquei e mesmo basquete. Preferí me aprofundar na diversidade esportiva. Não sem antes narrar com Regis Nestrovski um jogo da Liga dos Campeões da UEFA em 1995, com a única participação do Ferencváros. O time perdeu, mas os brasileiros ouviram os nomes dos jogadores bem pronunciados.

Foi uma ironia do destino que seria eu quem faria a única matéria para o Brasil diretamente de Budapeste quando Puskas foi internado (A matéria feita para a ESPN Brasil está no You Tube). Foi quando entrevistei o goleiro Gyula Grosics (por quem me afeiçoei tremendamente) que voltei à falar no outro tio Gyula, o Mandi. Com ele e com o Jenö Buzánski. São os únicos restantes da Seleção de Ouro da Hungria. Mais irônico, e claro, um bocado triste foi caber à mim entrar no ar por telefone com o boletim do falecimento do Puskas.

Hoje os húngaros não são mais bons de bola, mas este húngaro- brasileiro aqui gosta muito de falar dela. Mesmo quando não é oval.

Wednesday, February 28, 2007

Achei hoje nos meus guardados.

De fogo branco

A brancura do papel na máquina chegava à ser implacável. Uma folha em branco colocada num ímpeto e que se quedava ansiosa, curiosa do seu destino. E talvez até mesmo ávida como uma virgem que levou tempo demais até se decidir. O papel começou à ser ao mesmo tempo o sujeito e o objeto. Como se fosse um assunto predileto. Mas não era.

Haviam tantos outros que poderiam cobrí-lo, como num ato de amor, de fé, ou mesmo com a força de um trovão um ato de ira há muito contida. Mas as palavras insistiam em se formar no sentido único de cobrir o papel, bem formuladas talvez, mas relutantes em sair do que estava se tornando um círculo vicioso. Quem sabe uma elipse viciosa, pois pressentia-se a possibilidade de novos temas. Não adianta querer me abandonar. Nem mesmo ficar tão apaixonada, que nada. Mistério sempre há de pintar por aí...

_Por que não escrever sobre ela?
_A folha em branco?
_Não. Sobre ela. Ela, aquela moça de fogo.

A moça de fogo era um tema bastante para cobrir muitas páginas em branco. E para ser coberta em muitas noites em branco. Mas resistia, como se fosse queimar o papel ao ser descrita, falada, assumida ou amada na folha em branco, que (já meio coberta) saracoteava pra cá e pra lá, de linha em linha.

_Por que não escrever sobre ela?
_A folha em branco?
_Não. Sobre a moça de fogo.
_Mas se até já escreví.
_Pouco. É preciso escrever mais. Pelo menos até chegar ao final da folha em branco. E preto.

O espaço era grande demais e mínimo para se contar mais sobre a moça de fogo que iluminava os dias azuis e as noites em branco. Não era possível sequer fazer uma boa descrição dos seus longos cabelos que não eram de fogo. De sua boca quente, cálida nas palavras e no amor. De seus olhos de uma divindade demoníaca. De uma candura angelical quando lançava chamas como um dragão mitológico. Como em tão pouco espaço, e ainda tanto, explicar o som infantil de sua voz de mulher de muita vivencia, que adquiria por vezes modulações da maior gravidade. Como resumir em muitas palavras o corpo de fogo da moça. Como fazer entender que o corpo de fogo ficava frio em certas noites frias ou quentes. Frio como só a moça de fogo sabia transmitir quando decidia. É tao fácil e tão difícil escrever sobre a moça de fogo.

_Por que não escrever mais sobre ela?
_A moça de fogo?
_Ou a folha em branco.
_Porque acabou. Acabou o branco. Ficou uma vaga sensação de frio calor.

(escrito em uma folha, numa noite de dor de corno em 1977, ouvindo “Doces Bárbaros”.)

Tuesday, February 27, 2007

Viva o vIRCio!

Quem me ligou em internet foi o meu velho amigo Ceninho. Tipo em dezembro de 1995 ele me falou que dava pra bater papo teclando direto, e que sairia muito mais barato do que ligações internacionais Brasil-USA. Em janeiro de 1996 eu comprei meu HP e fiquei deslumbrado. Calouro, gastei uma fortuna porque assinei AOL, Compuserve, e mais um outro provedor cujo nome esquecí mas na certa já foi absorvido. Era para “testar” o melhor. No começo eu achava um barato o “You have mail” do American Online, mas em poucos dias me deu nos nervos.

Bem, ele disse que era para eu baixar um programa chamado mIRC e entrar no canal #Brasil da Undernet. Confesso que achei “undernet” extremamente “undigrudi” e atraente. Baixei o tal programa, e entrei no tal canal. Só não achei o Ceninho. Antes tinha que escolher um nick e escolhí TouchDown só pra ver se tinha muita gente que saberia o seu significado. Naquela época não tinha mesmo. Eu ví foi uma lista de nicks, alguns com um @ na frente e outros não. Achei legal a arrôba e tentei usar uma mas o sistema não aceitou. Pouco depois fui informado de que a @ indicava quem era OP do canal. Hmmm... OP... operador. Tudo bem.

Fui batendo papo e de repente começaram à aparecer umas janelas com DCC escritas nelas, para eu aceitar ou não. Fiquei sabendo que eram papos particulares. Tudo bem. Muita gente me ajudou a navegar pelo sistema. Naquela época a ESPN só passava em português para quem assinava TVA e mesmo assim só a tecla SAP. Eu era apenas um cara perfeitamente desconhecido, que morava nos Estados Unidos e estava querendo bater papo com brasileiros.

Me convidaram para entrar no canal #Rio. Eu fui. Tinha muito menos gente e logo fiz amigos: PetroVisk, BMW-RJ, NewLennon e outros. Tinha um @Nietzsche que não falava nada. Eu esperava que ele ao menos dissesse coisas tipo “Um par de óculos poderosos basta às vezes para curar uma pessoa apaixonada”, ou outras pérolas do filósofo alemão. Mas este Nietzsche não era nem filósofo, nem alemão, e nem sequer uma pessoa. Era o “bot” do canal. Um programa apenas para reservar e proteger o canal de ataques. Mas o #Rio não era registrado na undernet que tinha os seus próprios bots (vem de “robot”), o X e o W. Depois dispensaram o W e o X está lá até hoje.

O mIRC passou à ser meu programa predileto. Era maravilhoso chegar em casa e ficar de papo até altas horas. Era o “vIRCio”. Fiz amizades que duram até hoje, e algumas vão durar o resto da vida com certeza. Muitos desapareceram por outros caminhos. Um dia fui banido do canal por um op porque sem querer eu fiz um “flood”. Errei um comando e as linhas se repetiram várias vezes na janela do canal. Eu fiquei ofendidíssimo e falei em pvt com o @^Ghost que imediatamente me desbaniu. Mesmo assim continuei ofendido e disse que não voltava mais lá. Bem, durou até de noite quando o @Goncalves que era 499 do canal (tipo um vice-presidente) me convidou e insistiu que eu voltasse como... op! Surgia o @TouchDown. Mais tarde eu fundaria o #Brasil-USA com uma outra filosofia. Mas isto fica para outro dia!

/msg X@channels.undernet.org login touchdown senha

:)

Monday, February 26, 2007

Eu sempre gostei de brincar com colagens…

Talvez porque elas tenham um aspecto atemporal e são multidimensionais como a própria vida. Talvez pela revelação trazida pelos contrastes. Até este blog está sendo escrito como uma colagem.

Claro que a informação numa sequencia lógica torna-se mais fácil para uma rápida absorção. E digestão. Mas quando a gente quer dar o balanço de um dia, qualquer dia, é uma colagem que aparece na mente. A gente mistura a vitória do Flamengo sobre o Vasco por pênaltis com o Oscar do Martin Scorsese. A apreensão de notas faltas em Brasília com a doença do presidente do Iraque. A limada do Aron Brooks do Oakland Raiders com o update do Mozilla. O MSN com o Orkut, o Fotolog com o Blog.

Eu curtia muito fazer colagem com objetos nos anos 60. Lembro que a grande figura de Milton Tierry, conhecido nos meios do cinema e nos da gandaia cariocas, era um dos admiradores das minhas colagens. Não sobrou nenhuma e hoje nem sei se seriam boas. De qualquer modo sempre redimensionavam o momento.

Mas eu sempre curtí fazer colagem com fotos. Na era pré-digital era a melhor maneira de ver um bocado de fotos juntas em exposição. E para mim sempre foi também uma maneira de ter a presença de família e amigos por perto quando eu já estava morando longe. Comecei cobrindo a porta do estúdiozinho onde morei por 10 anos em Greenwich Village. E cheguei ao auge quando a garagem da minha casa em Bristol estava com todas as paredes práticamente cobertas com colagens.


Era uma coisa legal chegar em casa e ver. Parecia que de certo modo eu tinha os amigos me esperando. Os olhos batiam num e noutro. Cada vez um momento registrado com alguém que eu gosto. Momentos em várias cidades por onde já passei ou viví. E também uma forma de ter o Brasil em casa. O meu Brasil. O Brasil que está sempre comigo onde quer que eu esteja.



(da esq. p dir, entre Reginaldo Faria e Paulo José no Rio, em frente à posters do Cloud 9 (uma peça que acebi dirigindo no Brasil) no Soho, de cabeça rapada ao lado de Pedro Carlos Rovai no Rio, entre Natália do Vale e Carmen Lúcia no meu apêzim de NYC, com a Beatriz Schiller, que era correspondente do JB em Nova York e a Betty Farias numa festa na casa da Laurita Mourão, Maria Zilda Bethlem lá em casa no Village, Simone me visitando lá no Village também, com a querida e saudosa Sandra Bréa, com a Maria Pompeu (tudo lá na 8th Street), levantando meu sobrinho Marcio no Central Park (hoje não daria mais pra isto!), e cantando no Bar Five Oaks no Village.)

A única coisa chata foi que quando eu tive que desmontar estes quadros algumas fotos se ferraram, mas os momentos não serão esquecidos. (da esq. p dir, Redi e Eduardo Conde no Hotel Saint André des Arts em Paris (1979), com a Berenice que me ajudou a descolar o apêzinho da Rua 8, com o meu sobrinho Marcio em frente ao Edifício Dakota em NY, Joãozinho Trinta (que apareceu lá em casa uma vez com o Mauricio Sherman), Marilda Pedroso (é... o estudiozinho tinha até uma lareira), Ney Matogrosso na noite da minha festa de despedida em 78, quando eu morava no Leblon, eu - magrinho ainda- em frente ao Hotel Tropical, em Manaus, e Carmen Lúcia com a minha sobrinha Patrícia e no fundo o meu irmão Thomas e eu no apê da Carmen em NY em 1981, acho.)



E só este texto com estas lembranças já redimensiona, como colagem, esta manhã chuvosa e cinza em Budapeste, quando até meu cachorro Joe Montana está com preguiça de brincar...